Hoje me lembrei de você, enquanto dormia. Sim, você esteve aqui e me abraçou, como já nos abraçamos tantas vezes, antes...
Você não tinha mais a face crispada de rancor, nem os olhos marejados de mágoa. Você sorria um sorriso leve e tímido, entrando como quando se pede licença para entrar na casa de um amigo novo.
Mas era na minha casa em que você entrava, a mesma que você conhecia tão bem, tão cheia das marcas da sua presença, onde juntos já falamos, dançamos, cantamos, rimos e choramos sobre tudo e repousamos sobre a certeza de que sempre teríamos ali estendida a nossa mão, viesse o que viesse.
Até ontem eu pensava que não queria mais te ver porque – você sabe – a briga foi feia. As palavras brotadas da sua raiva, cuspidas pelas narinas, me atingiram como balas no peito – em meu peito que sim, estava aberto, inflamado. Eu até adoeci, mas os exames não encontraram nada.
Por um tempo, a rua da nossa casa ficou estranha, vazia. Tentei esquecer, virar a página. Você me desejou mal, pensou em vingança. Como pode?
Mas hoje, enquanto eu dormia, você entrou aqui, trazendo caixas vazias, vindo buscar algumas coisas que ficaram e ao te ver com o semblante tão puro, tão nobre, tão humilde, eu me lembrei de você mais uma vez. Você também me viu e veio em minha direção, eu me levantei da mesa, você me abraçou.
Então eu chorei. Acho que choramos. Fazia tempo que eu não chorava. Aquele abraço, sabe – não sabe? Que lava tudo, faz reviver todo o bem-querer. Aquele que a gente demora pra soltar. Você sempre soube, mais do que ninguém, o poder que tem um abraço.
Eu já te quis tão bem, mas não sei se sua raiva ainda te domina e isso ainda dói.
Você deve lembrar que eu gosto muito do Vinícius. Ele diz que é a coisa mais triste que existe quando um amor acaba. Confesso que eu já acreditei nisso, quando era mais jovem, arrebatada por paixões que avassalam e que parecem quebrar ao meio o coração, queimar tudo por dentro, desesperar...
Mas hoje, não. Hoje pensei que a coisa mais triste quando acaba, é a amizade.
Amantes vão e vêm. Casamentos se desfazem, às vezes não funcionam, às vezes trazem infelicidade, amor eterno existe? Não sei.
Mas a amizade, sim – a amizade sim, devia ser pra sempre.
Amigo – posso te chamar assim? – hoje eu me lembrei de você.
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