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Por Um Terrorismo Feminista



Eu sou um homem nascido em uma sociedade patriarcal e machista. Cresci, diria até, em meio a uma sociedade protofascista que transbordava misoginia e com uma forte cultura de estupro escondida em recônditos que nenhum “macho” comenta. Onde pornografia é a arte da liberdade da mulher e não uma exploração sexual masculina, arte essa (que deixemos claro) se expandiu para todos os lados com o advento da internet.


Eu devia ter uns 16 anos (não muito mais que isso e nem muito menos) quando li pela primeira vez o A Rainha dos Condenados da Anne Rice. Eu estava apaixonado pelo universo homoerótico de vampiros da escritora na época, lembro que na minha cidade tinha até um bar nessa temática que costumava a frequentar (The Blood Coven Bar) por um tempo. Minha paixão pelos livros da Rice durou bastante tempo e foi, assim como Harry Potter para muita gente dessa geração, uma porta para o universo de literatura para mim. Bem, voltando ao livro em questão, no plot o Vampiro Lestat tem que enfrentar Akasha, a mãe de todos os vampiros que depois de milênios ponderando percebe que a melhor solução para o mundo é eliminar a população masculina e manter apenas uns 10% para fins de procriação. “QUE ABSURDO!” lembro de ter pensado na época, assim como os vampiros que a enfrentam usei o velho argumento “mas nem todo homem”.


Há! Reli o livro ano passado. Para minha surpresa só li verdades saindo da boca de Akasha, não pude deixar em torcer por ela, mesmo sabendo o final do livro. Não pude deixar de gritar para aqueles vampiros do passado “Hey, seus idiotas! Eu estou em 2022 e continua a mesma bosta!”.


Tive meu primeiro contato com o Confederalismo Democrático de Abdullah Öcalan na faculdade quando estudava economia, há mais de 10 anos já, e desde então toda a minha personalidade foi sendo alterada: valores, comportamentos e a própria maneira de enxergar o mundo. Ainda me considero um novato em estudo feminista, mas foi a jineologia¹ encabeçada por Sakine Cansiz que me fez enxergar que era preciso matar o “macho” que existia em mim (ou Erkegi öldürmek² como é dito pelo movimento curdo) para que outro eu melhor surgisse. Todo este processo ainda está em curso e acredito que ainda está no começo. Digo sempre que o feminismo tinha que ser matéria obrigatória em escola com o mesmo peso de importância de uma matemática.


Sem entrar em questões ideológicas ou políticas, quando vemos guerras como a da Ucrânia ou mais recentemente o que ocorre em Gaza, o corpo da mulher é o primeiro território ocupado. Estupros e abusos são corriqueiros. E que fique claro, isso é em todos os lados do conflito, sem exceção.


Li recentemente que o terrorismo, quando usado em uma situação de colonialismo e apartheid, é reconhecido pelas leis internacionais. Oras, se é assim, existe algo mais colonizado e que viveu em apartheid por mais tempo do que a classe social feminina? Acredito que não. A mulher foi a primeira colonização da história humana e assim permanece até hoje. O que volta a me remeter a Akasha do livro de Rice, pois eu aceitaria ser só mais uma vítima da casualidade se fosse para morrer vendo a raça “Machus heterotopis” realmente em pânico e aterrorizada por um terrorismo feminista que forçasse uma mudança significativa desta sociedade falida que temos hoje.


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1- A jineologia (em curdo: jineolojî, "ciência das mulheres"), também conhecida no ocidente como "feminismo curdo", é uma forma de luta pela libertação das mulheres, igualdade de gênero e revolução social.


2- O lema “Erkegi öldürmek” (matar o macho dominante) é gestado como concepção teórica, política e ideológica de combate sistêmico.

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